Como supor que aquele garoto franzino, nascido e criado na dificuldade da pobreza como tantos em nosso país, pudesse vencer as fronteiras e conquistar o respeito mundial através do esporte. Adhemar Ferreira da Silva, nascido em São Paulo no dia 29 de setembro de 1927, tinha tudo para ser mais um brasileiro mal-aventurado, escravo da fome e da falta de dignidade. O treinador de atletismo José Márcio Cato, do São Paulo, em 1947, talvez tenha morrido sem saber que deu o primeiro impulso nos objetivos de Valdemar. É que falou com tanto entusiasmo a palavra atleta que acabaria persuadindo Adhemar: “Gostei da palavra atleta, por isso resolvi começar a competir”, disse. Seu talento ficou evidenciado quando, aos dezoito anos, após receber algumas instruções, conseguiu saltar 12,9 m espantando a todos envolvidos no esporte. Ali havia um enorme potencial de um atleta especialista no salto triplo. Na primeira competição, o troféu Brasil, conseguiu a marca de 13,05 m, considerada muito boa para o padrão nacional da época. Naoto Tajima era o detentor do recorde olímpico obtido nos jogos de Berlim, em 1936. Portanto sua marca perdurava por 14 anos sem ser molestada. Chegara à fantástica marca para os padrões da época, 16 m. Veio ao Rio de Janeiro competir pelo mundial de atletismo e tinha noção que iria encontrar pela frente o garoto fenômeno, que parece ter nascido para reinar no salto triplo. Adhemar então quebra o recorde mundial, ultrapassando a barreira dos 16 m. Consegue saltar 16,01 m. Os especialistas o classificavam como biotipo perfeito para o esporte olímpico de alto rendimento. Elegante e altivo, tendo como marca principal o equilíbrio, diziam. A consagração máxima viria em 1952, nos jogos de Helsinque, na Finlândia. Dia 23 de julho, no auge da sua forma física e técnica, espantou o planeta ao quebrar quatro vezes, em seis tentativas, o próprio recorde mundial. Saltou 16,05 m, 16,09 m, 16,12 e finalmente os famosos 16,22 m, marca que lhe deu a glória do ouro olímpico pela primeira vez. O russo Leonid Shcherbakov, seu principal concorrente, se contentou em aplaudir o campeão olímpico e comemorar sua suada medalha de prata. Afinal, Adhemar era imbatível. Na cerimônia de premiação, já no podium, ouvia os gritos frenéticos da torcida finlandesa. Da Silva, Da Silva, Da Silva. Após receber as flores, e se voltar para as bandeiras vencedoras, mal pôde ouvir o hino nacional brasileiro, tal era a euforia dos torcedores na arquibancada. Foi quando o juiz da prova o chamou e lhe pediu humildemente para que desse uma volta em 360 graus por toda pista do estádio para saudar a torcida eufórica pelo espetáculo da performance de Adhemar. Ele assim o fez. Estava a partir dali instituída a volta olímpica dos vencedores nas competições. Adhemar é dos poucos atletas bicampeões olímpicos, viria repetir o feito em Melbourne no ano de 1956. Giovane e Maurício do vôlei; Robert Scheidt, Torben Grael e Marcelo Ferreira, iatistas, possuem essa glória também. Contudo a volta olímpica é criação de Adhemar Ferreira da Silva e está eternizada na história do esporte mundial.